
Conta‑nos uma lenda
que um homem a quem cumpria fazer grande jornada, deram a carregar pesada cruz,
dizendo‑lhe que ela o levaria à salvação.
Tendo feito pequena parte do
trajeto, vencido e desanimado pelo cansaço, deliberou ele cortar um pedaço da
longa haste de sua carga.
Mais aligeirado pôs‑se de
novo, a caminho, e jornadeou até o ponto em que a estrada subia por uma encosta
longa e pedregosa. Ali sentiu que se lhe agradava o peso da cruz. Doíam‑lhe os
ombros, tinha as pernas trôpegas, arfava e transudava.
Na irreflexão da impaciência,
põe por terra o seu fardo e outra vez o mutila em sua haste.
Parte. Alcança o sopé do
outeiro e se vê às margens de um rio sem ponte.

Estes as estenderam de margem
a margem e fazendo‑as de pontilhões, atingiram o lado oposto e lá se foram.
O que, porém, encurtara a
haste de sua cruz viu, desde logo, que ela não lhe poderia prestar o mesmo
auxílio. Tentando meter‑se pelo rio a dentro, desapareceu levado pelos
redemoinhos da correnteza.
É límpida a lição da fábula.
Todos os que vivemos a cortar, com golpes arbitrários, em nossos deveres e
obrigações para com Deus, podemos levar, por algum tempo, vida mundanamente
fácil mas sempre enganosa. O dia chegará em que seremos vítimas das mutilações
feitas na haste da fossa cruz.
Lendas do Céu e da terra
Malba Tahan
Ed. Borgoi
São Paulo ‑ SP
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