Quem seria capaz de imaginar a grandeza da Assunção
de Nossa Senhora? Leia abaixo alguns belíssimos comentários sobre este acontecimento, cuja solenidade a Igreja celebra no dia 15 de agosto.
Imaginando como seria a
reação dos apóstolos ali presentes, Dr. Plinio procura
recompor tão grandiosa cena.
Hoje se comemora a Assunção de Nossa Senhora, festa de todos os gáudios,
do dia em que Nossa Senhora, ressurrecta, tendo abandonado sua condição mortal,
sobe aos Céus levada pelos anjos. O Céu inteiro participou desta alegria.
Que reflexão convém fazer a respeito da Assunção
de Maria Santíssima?
“Onde está o lugar para minha Mãe?”
Imaginemos a noite de Natal. Ela continha um
néctar, uma poesia, um encanto, propiciando um discernimento de espíritos por
onde todo o mundo de certo modo sentia e conhecia a graça de Deus, pela
qual Cristo descia como um orvalho do mais alto do Céu, ou seja, do claustro
sacratíssimo de Nossa Senhora, e, sem transgredir a virgindade intacta e
ilibada da Mãe, entrava nesta Terra. A Virgem teve um Filho e a Terra se
extasiou.
É realmente uma maravilha. Mas depois acontece outra maravilha.
É a obra-prima da Criação que vai entrar no Céu. O que houve no reino do criado
de mais alto foi a humanidade santíssima de Nosso Senhor Jesus Cristo. Ele foi
o primeiro a entrar no Paraíso, e no seu sulco foram as miríades de almas que
estavam no limbo. Nunca teremos uma ideia suficiente nesta Terra a respeito da
glória inimaginável da entrada de Nosso Senhor no Céu.
Ascencao_StaMariaMaggiore_Roma |
Somos incapazes não só de descrever, mas de imaginar o que se
passara no
Tabor, quando o Divino Salvador ali foi glorificado. Pois bem, ao entrar no
Paraíso, sua glória era incomparavelmente maior que a manifestada no Tabor. E a
alegria dos habitantes do Céu não pode ser comparada com a dos que estavam no
monte, vendo Nosso Senhor transfigurado, e pediam para fixar umas tendazinhas permanentemente.
E, no esplendor do Céu, tendo festejado na sua humanidade o
encontro com o Pai e com o Espírito, depois de tomar gloriosamente assento —
sua natureza divina nunca deixou o Céu —, por assim dizer, seu pensamento deve
ter sido: Onde está o lugar para minha Mãe?
Imagino que Ele, então, começou a preparar tudo para o dia da
Assunção de sua Mãe. Porque, depois da Ascensão, a maior festa do Céu foi inegavelmente
a Assunção, durante a qual se poderia dizer que todo o universo estava numa
alegria especial.
Explicitação das glórias existentes em
Maria
Os Apóstolos, certamente, ficaram desolados com aquilo que a
Igreja — mestra de todas as delicadezas — chama “dormitio Beatae Mariae Virginis”, a dormição da Santíssima Virgem Maria.
Em português a palavra “dormição” não existe, exceto para se referir à morte de
Nossa Senhora, a qual foi leve como um sono.
Logo depois da dormição, os Apóstolos, ainda desolados, veem Maria
Santíssima que ressurge. Imaginemos que a Assunção tenha ocorrido no próprio
Tabor.
Julgo que toda a glória existente em Maria Santíssima
começou, então, a manifestar-se aos presentes, como outrora sucedera com Nosso Senhor
no alto daquele mesmo monte.
Todas as bondades, toda a suavidade, soberania, todo o
domínio, atrativo, a virginal intransigência e firmeza, n’Ela se afirmavam de
um modo esplêndido, e iam misteriosamente reluzindo e acentuando-se. Tenho a
impressão de que, quando isto se iniciou, as pessoas ali presentes lançaram
exclamações, depois começaram a cantar e, por fim, o canto foi morrendo e, se
assim se pudesse dizer, passou a zumbir, mas zumbir celestialmente, o silêncio de
quem já não ousava dizer nada.
Até certo momento as pessoas ainda se entreolhavam; depois,
como que esquecendo haver outros perto
delas, só olhavam para Nossa Senhora, a qual não cessava de manifestar
sucessivamente quintessências de Si mesma. E tinham a impressão de que não era
a Santíssima Virgem que ia subir, mas o céu desceria até Ela. Dir-se-ia que a
cúpula celeste estava se tornando cada vez mais baixa e, se alguém estendesse a
mão, tocaria com os dedos no azul!
Certamente, a isto correspondeu, em determinado momento, uma sensação
de tal veneração e inferioridade, mas ao mesmo tempo de tal intimidade, que
cada um sentia Nossa Senhora dentro da própria alma, tão meiga, afagante,
recomponente, tonificante, reparadora, e Mãe.
“Embebidos”
de Nossa Senhora...
Algo de muito profundo
operou-se nas almas, onde a palavra de Deus penetra como um gládio com dois
gumes. Ora, se lá entra a palavra de Deus, por que não penetraria o afeto da
Mãe de Deus? E então todos se sentiam como que embebidos de Nossa Senhora, à
maneira de um papel sobre o qual se põe azeite perfumado, e já não sabiam mais
o que dizer.
Em certo momento, começam os ares a se mover
e os ventos como que a tomar formas que flutuam de um modo singular; definem-se
figuras angélicas em torno de Maria Santíssima e o céu se revela sucessivamente
cheio de anjos que cantam.
Ela havia chegado ao auge de seu
esplendor, mas, para mostrar que supera todos os anjos, o aumenta ainda mais
até o indizível, de maneira que os próprios anjos se tornam pálidos, em
comparação com Nossa Senhora.
Os presentes acompanham com exclamações e não
percebem que Ela perdeu toda a proporção com a Terra; é a hora da despedida...
Maria
Santíssima começa a mover- se, a olhá-los com um afeto, procurando transpor uma
distância cada vez maior, e eles sentem que a separação está acontecendo. E ao
mesmo tempo se entristecem e se
alegram, choram e se extasiam, sentem-se no Céu e na Terra do exílio. Eles vão
prestando atenção nos anjos, devido a seus cantos cada vez mais indizivelmente
belos.
Em certo momento, eles
verificam que Nossa Senhora tinha desaparecido no vértice dos anjos, os quais
revoam e cantam mais algum tanto para consolá-los. Depois vão sumindo
gradualmente...
Eles percebem, então,
que estavam juntos, começam a se olhar e ficam quietos. De repente, um diz:
“Vamos para casa?” E outro responde com voz suave: “Sim, pois já é tarde!” E começam a descer o Tabor. Caminhando,
conversam entre si: “Lembra-se de tal
coisa? Daquela cena? De tal outra beleza?” Quando dão acordo de si, estão
todos cantando.
E, ao se
despedirem, eles se perguntam: “Quando
nos reencontraremos para continuar relembrando aquelas maravilhas?” E
comentam: “Há um modo de nos
encontrarmos: sermos todos consoantes
com Maria Santíssima. Ela estará conosco, e onde está Ela está Nosso Senhor.”
Como veem,
não ousei descrever Nossa Senhora, mas sim a reação daqueles que olhavam para
Ela. Não acredito que alguém tenha — pelo menos, não sinto em mim — talento ou
capacidade para descrevê-La em sua totalidade. Quem julga possuí-los, se engana.
Lembro-me do
expediente empregado por Dante Alighieri no canto último da Divina Comédia.
Depois de ter percorrido todo o Céu, ele se apresenta a Deus, mas não ousa
olhar para o Lumen Incriado, que está brilhando. Então volta sua vista para
Nossa Senhora e, nos olhos d’Ela, ele vê o lumen de Deus. E, com o famoso hino
final à Santíssima Virgem, Dante termina a Divina Comédia. Assim, é justo que
olhemos para as almas daqueles que viram Nossa Senhora subir ao Céu, para
vermos o reflexo d’Ela.
(Dr. Plinio Corrêa de Oliveira - Extraído de
conferência de 15/8/1980)
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